O testamento é um ato pessoal e unilateral de vontade, revogável, pelo qual uma pessoa dispõe, para depois da morte, de todos os seus bens ou de parte deles.
Trata-se de um ato que decorre da liberdade conferida a qualquer cidadão de testar, de não testar e de revogar o seu testamento.
O que são
O testamento é um ato pessoal e unilateral de vontade, revogável, pelo qual uma pessoa dispõe, para depois da morte, de todos os seus bens ou de parte deles.
Por testamento podem constituir-se fundações, ceder-se créditos, inclusive hipotecários, consignar-se rendimentos, constituir-se hipotecas, direitos de usufruto, de superfície ou de servidão ou afetar-se imóveis ao regime da propriedade horizontal.
O testamento pode ainda conter disposições de caráter não patrimonial, tais como a perfilhação, a nomeação ou a revogação de nomeação de tutor ou de testamenteiro, a confissão, a deserdação ou a reabilitação de sucessor indigno e a revogação de testamento anterior.
Do testamento podem também constar meras instruções sobre aspetos relacionados com a morte, como o tipo de funeral, o depósito dos restos mortais, a cremação, a distribuição de esmolas ou os sufrágios por alma do defunto.
Casos específicos de legados são os legados pios, para obras de beneficência e caridade, e os legados de interesse público.
As disposições a favor da alma (despesas de culto com o funeral e encargos posteriores com sufrágios por alma do defunto) são comunicadas pelos notários ao ordinário da diocese a que pertencer o lugar de abertura da herança e os legados de interesse público à câmara municipal do respetivo concelho.
A celebração de testamento pressupõe uma reunião prévia com a notária para apurar a vontade real do testador.
O testamento só é válido se o testador exprimir claramente a sua vontade no momento da sua celebração, garantindo a lei, pelas formalidades a que o sujeita (celebração na presença de um notário e de duas testemunhas), que o testador realmente quis e entendeu o que declarou e que o fez livre de coação ou pressão familiar ou de terceiros interessados nos seus bens.
Carece de capacidade sucessória, por motivo de indignidade, quem, por meio de dolo ou coação, induziu o testador a fazer, revogar ou modificar o seu testamento ou disso o impediu.
Sendo o testamento um ato pessoal, não podem duas pessoas testar no mesmo testamento (o chamado testamento de mão comum), nem pode o mesmo ser feito através de procurador ou ficar dependente do arbítrio de outrém; porém, se um cônjuge pretender fazer uma deixa que tenha por objeto um bem comum do casal, pode o outro cônjuge prestar consentimento no mesmo testamento.
Forma
O testamento pode ser público ou cerrado (formas comuns), militar, marítimo, aeronáutico, feito em caso de calamidade pública ou feito por português em país estrangeiro (formas especiais).
O testamento público tem as vantagens de maior segurança e conservação do documento, que fica a fazer parte do arquivo notarial, e ainda de exame prévio do seu conteúdo por um perito qualificado, o notário, que é o seu autor e que aconselhará o testador caso detete algum vício substancial na deixa que este pretende fazer.
Por seu turno, o testamento cerrado, que é da autoria do testador e não do notário, apresenta as vantagens de não ter que ser lido em voz alta na presença do testador e das testemunhas, o que só ocorrerá se o testador o desejar, limitando-se o notário a anotar e corrigir irregularidades puramente formais, e ainda a de poder ser revogado com a mera destruição física do documento.
A lei portuguesa, atento o caracter transcendente do testamento, que se destina a produzir efeitos após a morte, não reconhece qualquer valor jurídico ao testamento verbal, ainda que feito perante testemunhas (nuncupativo), nem ao testamento escrito sem intervenção do notário (hológrafo), sem prejuízo de, no caso das indicadas formas especiais, equiparar certas entidades ao notário, embora fixando a este tipo de testamentos um curto prazo de validade.
O testamento de português feito no estrangeiro com observância da lei do país em que foi feito só produz efeitos em Portugal se o ato tiver tido intervenção de notário ou entidade equivalente.
Não obstante o caráter formal do testamento, é válida a remissão de um testamento para documentos autênticos ou escritos e assinados pelo testador com data anterior à do testamento ou contemporânea desta.
Pode ainda recorrer-se a prova complementar para interpretar um testamento, desde que a vontade do testador apurada com base nessa prova tenha no contexto do testamento, como ato global, um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expressa.
Quem não pode testar
Não podem testar os menores não emancipados e os interditos por anomalia psíquica, ainda que através de representante, nem as pessoas coletivas, sob pena de nulidade.
Porém, os pais podem instituir herdeiro para o caso de o filho menor falecer na menoridade ou enquanto durar a anomalia psíquica e até onerar o instituído com o encargo de cuidar do filho incapaz.
A capacidade para testar reporta-se à data da assinatura do testamento.
Revogabilidade
O testamento pode ser revogado a todo o tempo, com exceção da perfilhação.
O testador não pode renunciar à faculdade de revogar o testamento, tendo-se a renúncia por não escrita.
A revogação pode ser expressa, mas também pode ser tácita, se o testador fizer testamento posterior, na parte em que este seja incompatível com o anterior.
Mesmo que o testamento posterior venha a ser revogado, o primeiro testamento não renasce nos seus efeitos, a não ser que o testador o declare expressamente.
A alienação posterior pelo testador de bem que tenha sido legado no testamento implica a revogação da deixa, assim como a transformação do bem pelo testador de que resulte um bem diferente.
Caducidade
O testamento caduca se o beneficiário falecer antes do testador ou repudiar a deixa e não deixar filhos, se o testamento for sujeito a condição susensiva e o contemplado falecer antes da verificação da condição, se o instituído de tornar indigno ou se o mesmo era cônjuge do testador à data da celebração do testamento, mas à data da morte do testador já se encontrava dele divorciado ou separado judicialmente de pessoas e bens.
Testamentaria
O testador pode nomear uma ou mais pessoas, que podem ou não ser herdeiros ou legatários, que fiquem encarregadas de vigiar o cumprimento do testamento ou de o executar, no todo ou em parte, conferindo-lhes os poderes que entender, inclusive poderes para vender bens pertencentes à herança.
Na falta de disposição expressa no testamento quanto aos poderes conferidos pelo testador ao testamenteiro, este poderá cuidar do funeral do testador e pagar as despesas com sufrágios, vigiar a execução das disposições testamentárias e exercer funções de cabeça-de-casal.
Lei aplicável à sucessão
Para residentes na UE a lei aplicável à sua sucessão é a da residência habitual, a não ser que manifestem em testamento a vontade de que seja aplicável à sua sucessão a lei da sua nacionalidade.
Saiba mais em Sucessões na Europa
Para portugueses residentes fora da UE a lei aplicável à sucessão é a da sua nacionalidade.
Quando seja aplicável a lei portuguesa, se a pessoa falecida tiver deixado cônjuge, filhos, netos, bisnetos, pais, avós ou bisavós vivos, uma parte da herança é-lhes necessariamente reservada (cônjuge sózinho 1/2, cônjuge e filhos 2/3, filhos 2/3 se vários e 1/2 se apenas 1 filho, cônjuge e ascendentes 2/3, pais 1/2, avós e bisavós 1/3), apenas sendo possível dispor da restante parte.
Testemunhas
Na celebração do testamento ou da escritura de revogação de testamento é obrigatória a presença de duas testemunhas.
Não podem ser testemunhas as pessoas que não estejam no seu perfeito juízo, as pessoas que não entendam a língua portuguesa, quem não saiba ou não possa assinar, os menores não emancipados, os surdos, os mudos, os cegos, os colaboradores do cartório, o cônjuge, os bisavós, os avós, os pais, os filhos, os netos, os bisnetos, os irmãos, os sogros e os cunhados, tanto do notário que intervier no ato como de outra testemunha, o marido e a mulher conjuntamente e quem por efeito do testamento adquira qualquer vantagem patrimonial.
Identificação
Testador e as duas testemunhas têm obrigatoriamente que se identificar com um dos seguintes documentos de identificação dentro do seu prazo de validade: bilhete de identidade, cartão do cidadão ou carta de condução emitidos por um país da UE (ou documento equivalente, militar ou diplomático), passaporte, título de residência, documento de identificação brasileiro com menção da nacionalidade do portador e referência ao Tratado de Amizade Portugal Brasil, bilhete de identidade angolano, cabo-verdiano, guineense, moçambicano ou são-tomense.
Na falta de qualquer um destes documentos, qualquer interveniente pode identificar-se pela abonação de duas pessoas que sejam portadoras de um dos referidos documentos dentro do prazo de validade.
Não podem ser abonadores, as pessoas que não estejam no seu perfeito juízo, as pessoas que não entendam a língua portuguesa, quem não saiba ou não possa assinar, os menores não emancipados, os surdos, os mudos ou cegos, os colaboradores do cartório, o cônjuge, os bisavós, os avós, os pais, os filhos, os netos, os bisnetos, os irmãos, os sogros e os cunhados, tanto do notário que intervier no ato como de qualquer dos outorgantes, representantes ou representados, o marido e a mulher conjuntamente e quem, por efeito do ato, adquira qualquer vantagem patrimonial.
Caso a abonação se refira ao testador, as testemunhas podem intervir também como abonadores.
Quanto ao testador são ainda necessários a morada e respetiva freguesia e concelho, a nacionalidade, o estado civil (e, se casado, o nome do cônjuge, o NIF do cônjuge e o regime de bens), e ainda, se portador de cartão de cidadão, a freguesia e o concelho de naturalidade.
No que respeita às testemunhas são necessárias as respetivas moradas e estado civil.
Registo
Os notários comunicam à Conservatória dos Registos Centrais a celebração de testamentos públicos, de escrituras de revogação de testamento e de instrumentos de aprovação, de depósito e de abertura de testamentos cerrados.
A Conservatória dos Registos Centrais detém os registos referentes a testamentos desde 1950.
Qualquer pessoa, incluindo o notário, pode pedir certidão da existência de testamento de pessoa já falecida através de formulário eletrónico.
Se o testador for vivo, a informação só pode ser dada a pedido do próprio, com autenticação com cartão de cidadão.
O pedido pode ainda ser feito presencialmente junto da Conservatória dos Registos Centrais.
Testamentos Públicos
O que são
Os testamentos públicos, que são da autoria do notário, são lavrados em livro próprio, após prévia análise da validade substancial das pretensões do testador, e são lidos em voz alta e explicado o seu conteúdo ao testador, na presença de duas testemunhas.
Os que não sabem (analfabetos) ou não podem (cegos) ler ou assinar só podem dispor na forma de testamento público.
Revogação
O testamento pode ser revogado por testamento posterior ou por escritura de revogação de testamento.
As escrituras de revogação de testamentos públicos, que são da autoria do notário, são lavradas em livro próprio e são lidas em voz alta e explicado o seu conteúdo ao testador, na presença de duas testemunhas.
Na escritura de revogação de testamento ou no testamento posterior que revoga testamento anterior é identificado o testamento que se revoga, com a indicação da sua data, cartório onde foi lavrado, livro e folhas e a revogação é comunicada a esse cartório para efeitos do averbamento da revogação ao testamento incial.
Ainda que não seja expressamente revogado por testamento posterior ou por escritura de revogação de testamento, total ou parcialmente, o testamento anterior tem-se sempre por tacitamente revogado na parte em que seja incompatível com o mais recente.
Acesso público
O testamento e a escritura de revogação de testamento apenas se tornam de acesso público com a feitura do averbamento do óbito do testador, lavrado mediante a exibição do respetivo assento de óbito.
Testamentos Cerrados
O que são
O testamento cerrado é um testamento manuscrito e assinado pelo testador ou manuscrito por outra pessoa a seu rogo e assinado pelo testador.
Ao invés do testamento público, no testamento cerrado, cujo autor é o testador, o notário limita-se a anotar e corrigir irregularidades puramente formais, lavrando o auto da sua aprovação na presença do testador e de duas testemunhas.
O testamento cerrado só é lido pelo notário em voz alta se o testador assim o desejar e na presença de quem este autorizar.
Na redação do testamento cerrado devem evitar-se as emendas, rasuras, traços, entrelinhas, borrões ou notas marginais que, se existirem, devem ser ressalvados pelo próprio testador, antes de o testamento ser aprovado pelo notário, que o pode auxiliar a fazê-lo.
Carece de capacidade sucessória, por motivo de indignidade, quem dolosamente haja subtraído, ocultado, inutilizado, falsificado ou suprimido um testamento cerrado, antes ou depois da morte do testador, ou quem se tenha aproveitado de algum desses factos.
Quem não pode fazer
Os que não sabem (analfabetos) ou não podem (cegos) ler ou assinar não podem dispor através de testamento cerrado: só o podem fazer mediante testamento público, uma vez que, sendo-lhes inacessível a leitura do testamento cerrado, não podem controlar se o que dele consta traduz fielmente a sua vontade.
Aprovação
O testamento cerrado, para ter valor jurídico, carece de ser aprovado perante notário e na presença de duas testemunhas e a sua data é, para todos os efeitos legais, a data da sua aprovação.
O testamento cerrado é da autoria do testador e o instrumento de aprovação da autoria do notário.
O testamento é lido apenas se o testador assim o desejar e na presença de quem este autorizar, mas o auto é sempre lido na presença do testador e de duas testemunhas, que, com o notário, rubricam todas as folhas do testamento e assinam o instrumento de aprovação.
As palavras escritas, rasuradas ou inutilizadas pelo testador no seu testamento cerrado após a aprovação têm-se por não escritas.
Destino do documento ou seu depósito
O testador pode conservar o testamento cerrado em seu poder, entregá-lo à guarda de terceiro ou depositá-lo em qualquer cartório notarial, sendo neste último caso o testamento obrigatoriamente cosido e lacrado.
Se o testador não pretender depositar o testamento cerrado pode ainda optar, querendo, por que o notário o cosa e lacre antes de lho devolver.
Depois de depositado em cartório notarial, o testamento cerrado pode ser levando quando o testador assim o pretenda.
Revogação
O testamento cerrado, se na posse do testador, pode ser revogado pela sua destruição física.
O testador pode levantar o seu testamento cerrado depositado em cartório para o inutilizar e, assim, o revogar.
Presume-se que o facto foi praticado por terceiro se o testamento são se encontrava no espólio do testador à data da sua morte.
Abertura
A pessoa que tiver a guarda do testamento cerrado deve apresentá-lo num cartório no prazo de 3 dias a contar do conhecimento do falecimento.
O testamento cerrado pode ser aberto em qualquer cartório notarial, mas se se encontrar depositado é aberto no cartório onde se encontra.
O testamento cerrado apenas pode ser aberto mediante a exibição do assento de óbito do testador e com a intervenção de duas testemunhas, passando a ser de acesso público após essa formalidade.
Diretivas antecipadas de vontade e procurações de cuidados de saúde
Diretivas Antecipadas de Vontade
O que são
O testamento vital (ou DAV) é um documento através do qual o interessado pode mencionar os cuidados de saúde que pretende ou não receber, nomeadamente a vontade de:
- Não ser submetido a tratamento de suporte artificial das funções vitais;
- Não ser submetido a tratamento fútil, inútil ou desproporcionado no seu quadro clínico e de acordo com as boas práticas profissionais, nomeadamente no que concerne às medidas de suporte básico de vida e às medidas de alimentação e hidratação artificiais que apenas visem retardar o processo natural de morte;
- Receber os cuidados paliativos adequados ao respeito pelo seu direito a uma intervenção global no sofrimento determinado por doença grave ou irreversível, em fase avançada, incluindo uma terapêutica sintomática apropriada;
- Não ser submetido a tratamentos que se encontrem em fase experimental e autorizar ou recusar a participação em programas de investigação científica ou ensaios clínicos.
Quem pode fazer
Só podem outorgar um documento de DAV as pessoas que, cumulativamente, sejam maiores de idade, não se encontrem interditas ou inabilitadas por anomalia psíquica e se encontrem capazes de dar o seu consentimento consciente, livre e esclarecido.
Revogabilidade
A DAV é livremente revogável pelo interessado.
Prazo de validade
O documento de DAV é eficaz por um prazo de cinco anos a contar da sua assinatura, sucessivamente renovável, mediante declaração de confirmação, mas mantém-se em vigor, sem prazo, quando ocorra a incapacidade do outorgante no decurso desse prazo.
Registo
As DAV são registadas no Registo Nacional do Testamento Vital - RENTEV
Procurações de cuidados de saúde
O que são
Qualquer pessoa pode, através da outorga de uma procuração de cuidados de saúde (PCS), nomear um procurador de cuidados de saúde (pCS), voluntariamente e de forma gratuita, atribuindo -lhe poderes representativos para decidir sobre os cuidados de saúde que o interessado pretenderia receber, ou não receber, quando e se vier a encontrar-se incapaz de expressar a sua vontade pessoal e autonomamente.
O interessado pode ainda nomear um segundo pCS, para o caso de impedimento do procurador primeiramente indicado.
Quem pode nomear procurador de cuidados de saúde
Só podem nomear pCS as pessoas que, cumulativamente, sejam maiores de idade, não se encontrem interditas ou inabilitadas por anomalia psíquica e se encontrem capazes de dar o seu consentimento consciente, livre e esclarecido.
Quem pode ser nomeado procurador de cuidados de saúde
Só podem ser nomeadas pCS as pessoas que, cumulativamente, sejam maiores de idade, não se encontrem interditas ou inabilitadas por anomalia psíquica, estando excluídos os funcionários do Registo Nacional do Testamento Vital, os colaboradores do cartório que intervenham no ato e os proprietários e os gestores de entidades que administram ou prestam cuidados de saúde, a não ser que essas pessoas tenham uma relação familiar com o interessado.
Revogabilidade e renúncia
A PCS é livremente revogável pelo interessado e extingue -se por renúncia do procurador, que deve informar, por escrito, o mesmo interessado.
Prazo de validade
A PCS é eficaz por um prazo de cinco anos a contar da sua assinatura, sucessivamente renovável, mediante declaração de confirmação, mas mantém-se em vigor, sem prazo, quando ocorra a incapacidade do interessado no decurso desse prazo.
Registo
As PCS são registadas no Registo Nacional do Testamento Vital - RENTEV